Estudo explora relação entre interesses empresariais e comportamento parlamentar no Brasil
Uma pesquisa realizada na Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP investigou o elo entre a atuação de parlamentares no Congresso Nacional e os interesses empresariais. Uma análise de projetos de lei que geram benefícios para os setores rural, comercial e industrial permitiu entender melhor como a influência destes grupos de interesse afeta as decisões políticas no País. Para o estudo, foram considerados os mandatos da 55ª legislatura, ocorrida entre 2015 e 2019. Os resultados do trabalho foram publicados no artigo Business interests and parliamentary behavior in Brazil, disponível na revista Interest Groups & Advocacy.
Seis fatores principais foram escolhidos para mensurar o peso das esferas econômicas abordadas na apresentação de projetos favoráveis a elas mesmas: doações de campanha realizadas por empresas desses três setores; a empregabilidade do eleitorado dos deputados dentro desses setores; o perfil ideológico do parlamentar; se o magistrado pertence à classe empresarial; se ele compõe comissões permanentes que tratam de assuntos relacionados aos setores mencionados; e seu tempo de mandato.
Os dados foram obtidos a partir de três principais fontes: a Confederação Nacional da Indústria (CNI), a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) e a Frente Parlamentar Agropecuária.
A pesquisa revelou que existe um perfil claro atrás das propostas alinhadas aos interesses empresariais. “O comportamento legislativo de deputados que pertencem a comissões parlamentares que regulam determinados assuntos mostra que eles tendem a ter uma visão mais positiva sobre aquele setor econômico”, explica Wagner Mancuso, primeiro autor do artigo, ao Jornal da USP. Comissões parlamentares são órgãos técnicos compostos de magistrados, que têm como objetivo aprofundar o debate sobre projetos de lei que sejam englobados pelo escopo da comissão. Ou seja, a Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural fica responsável pela discussão de programas e projetos de lei sobre a esfera agropecuária, por exemplo.
A ideologia é outro fator destacado pelo pesquisador. Deputados de centro e direita tenderam a apresentar propostas mais favoráveis aos três setores do que os de esquerda. Além disso, foi observado que, quanto maior o tempo de mandato do parlamentar, maior o número de projetos favoráveis à indústria, comércio e agronegócio.
Contudo, cada esfera possui sua particularidade. Em relação a doações de campanha, o setor industrial se mostrou mais prevalente – é o que mais realiza donativos e o que é mais favorecido. A centralidade do polo econômico para o eleitorado se mostrou mais importante para o campo rural: deputados que possuem eleitores que trabalham no campo tendem a apresentar propostas favoráveis ao setor. “Nós aprendemos que a importância desses fatores varia de setor para setor. Então, é preciso fazer um estudo que verifique não só o empresariado como um todo, mas de setor a setor. Assim, é possível observar que em alguns setores esses instrumentos de poder são relevantes e em outros não”, afirma o pesquisador.
Grupos de interesse podem ser classificados como organizações que buscam influenciar decisões políticas fora da via eleitoral. Mancuso destaca a necessidade de estudo sobre as interseções de setores econômicos no Congresso Nacional.
“Não dá para fazer ciência política sem colocar os grupos de interesse no jogo. Muitas vezes achamos que o jogo legislativo é meramente a relação do Executivo com o Legislativo, do governo com o Congresso. Nós esquecemos que essa relação está envolvida pela ação dos grupos de interesse da sociedade.”
Compreender as dinâmicas que permeiam o parlamento se torna essencial para um melhor entendimento do processo de tomada de decisões do País, explicita o pesquisador. Os deputados federais são responsáveis pela apresentação de projetos de lei, pela fiscalização de contas da União, por destinar financiamentos para determinados projetos e muitas outras importantes funções. “Todas as decisões cruciais para o futuro do País, neste caso, decisões econômicas, passam pelo parlamento. É preciso entender os fatores pelos quais o parlamentar responde, já que esses afetam decisões de grande impacto econômico”, finaliza.
Os resultados do trabalho foram publicados no artigo Business interests and parliamentary behavior in Brazil, disponível na revista Interest Groups & Advocacy.
Fonte: Jornal da USP (Texto: Camilla Almeida)
Foto: Agência Brasil